Andre Franca

COP 30: Um Vexame Global

A COP 30 chegou a Belém carregando promessas grandiosas de sustentabilidade e compromisso climático, mas para por aí. Antes mesmo dos líderes mundiais discursarem sobre redução de emissões e proteção da Amazônia, a cidade paraense se transformara num palco de contradições tão gritantes que até o mais otimista dos ambientalistas teria dificuldade em ignorar - com exceção aos apoiadores do governo de turno.

Comecemos pelo óbvio: a falta de infraestrutura. Belém, que já sofre com déficit de moradias de qualidade e saneamento básico, viu os preços do setor hoteleiro dispararem de forma absurda. Hotéis medíocres cobrando diárias equivalentes a estabelecimentos cinco estrelas em capitais europeias. O cidadão comum, aquele que realmente vive na cidade, foi praticamente expulso das opções de hospedagem enquanto observava uma especulação desenfreada que beneficiou poucos e prejudicou muitos. A Defensoria Pública do Pará chegou a receber denúncias de preços abusivos, com diárias que ultrapassavam facilmente dezenas de millhares de reais em hotéis que, em condições normais, não valeriam um décimo disso.

Mas a cereja do bolo veio com a hospedagem presidencial. Enquanto o discurso oficial enfatizava a necessidade urgente de reduzir a pegada de carbono, Lula e a primeira dama Janja se instalaram num navio de luxo ancorado na baía de Guajará. Sim, um navio que consome, segundo estimativas técnicas, centenas de litros de combustível por hora apenas para manter seus sistemas funcionando. A embarcação, equipada com ar-condicionado, geradores potentes e toda sorte de confortos, representa exatamente o oposto do que se esperaria de uma cúpula climática. É como pregar vegetarianismo num churrasco de picanha.

A ironia não para por aí. Reportagens da Folha de S.Paulo e do G1 revelaram uma série de irregularidades nas obras preparatórias para o evento. O Tribunal de Contas da União identificou indícios de superfaturamento em contratos de infraestrutura, com valores que não correspondiam aos praticados no mercado. Estamos falando de milhões de reais que simplesmente evaporaram em meio a licitações duvidosas e aditivos contratuais que faziam os custos inflarem como balão de festa junina.

A ciência, essa que deveria ser a protagonista absoluta de uma conferência sobre clima, está relegada a segundo plano. Pesquisadores sérios, com décadas de estudo sobre a Amazônia, vêm sendo ofuscados por discursos políticos vazios e fotos para redes sociais. Dados concretos sobre desmatamento, emissões de metano e degradação de ecossistemas são tratados como meros acessórios decorativos numa peça de teatro ensaiada.

O ceticismo aqui não é gratuito. A literatura científica aponta consistentemente para a necessidade de ações práticas e mensuráveis, não de eventos megalomaníacos que geram mais carbono do que soluções. Um estudo publicado na revista Nature Climate Change demonstra que grandes conferências internacionais frequentemente resultam em emissões significativas de gases de efeito estufa, considerando deslocamentos aéreos, infraestrutura temporária e consumo energético. A COP 30 não fuge dessa regra.

O favelão de Belém, expressão que ganhou força nas redes sociais, sintetiza bem o sentimento de improvisação e descaso que marcou o evento. Infraestrutura precária montada às pressas, problemas de saneamento em áreas próximas aos locais oficiais, e uma população local que assistiu a tudo de longe, sem participação real nas decisões ou benefícios concretos. A promessa de legado urbano soa oca quando se observa que as obras emergenciais não seguiram projetos sustentáveis de longo prazo.

Os escândalos de desvios, documentados pela imprensa investigativa, revelam um padrão preocupante. Empresas de fachada recebendo contratos milionários, subfaturamento de materiais, atrasos que resultaram em gastos adicionais. A Polícia Federal abriu inquéritos, mas sabemos como essas histórias costumam terminar no Brasil: muita investigação, pouca punição.

No fim das contas, a COP 30 em Belém vem servindo mais como vitrine de hipocrisia institucionalizada do que como avanço real na agenda climática. Enquanto o planeta aquece e a Amazônia "arde", continuamos presos num ciclo de eventos pomposos que custam fortunas e entregam migalhas. A ciência continua gritando seus alertas, mas parece que ninguém está realmente escutando, ocupados demais contando os lucros do superfaturamento ou posando para fotos oficiais.

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